A tarde parecia desvanecer-se lentamente em uma névoa suave enquanto Ryouma caminhava pela floresta, longe do campo de treinamento onde o confronto com Xiao Chenyu havia ocorrido. A calmaria do ambiente parecia contradizer a tempestade que havia se formado dentro de sua mente.
Ele havia vencido. Ou melhor, ele não havia apenas vencido; ele havia mostrado a eles o que significava realmente poder. Mas, em algum lugar, uma sensação de desconforto se instalava dentro dele. Não era sobre os outros, ou os desafios que viriam. Era sobre si mesmo.
Com o Desespero Primordial agora completamente acordado, uma parte de sua alma sentia-se estranha. Algo dentro dele estava começando a mudar. Ele sabia que, ao despertar esse espírito, havia dado um passo em direção a algo irreversível. E a questão que rondava sua mente era: até onde ele estava disposto a ir?
O caminho da ambição não era fácil. Ele já sabia disso. Mas o que mais ele precisaria sacrificar para alcançar os seus objetivos? E, mais importante, o que aconteceria com ele no final desse caminho?
A natureza ao seu redor parecia responder às suas perguntas, sussurrando com o vento, como se compartilhasse o peso de sua dúvida.
Quando ele parou em uma clareira mais aberta, o sistema soou dentro de sua mente.
Alerta: Status do usuário crítico.Mente do usuário em risco devido a fortes estímulos do segundo espírito.Atenção: Emissão de energia espiritual instável. Aconselha-se pausa no uso de habilidades do Desespero Primordial.
Ryouma franziu a testa, mas não desligou a tela do sistema. A sensação de desconforto era palpável agora. Ele estava começando a entender o preço que teria que pagar por usar esse espírito com tanta frequência.
Mas sua reflexão foi interrompida quando uma presença se fez notar, aproximando-se rapidamente. Antes que ele pudesse reagir, uma voz familiar surgiu.
— Achei que você tivesse fugido. — Era Lan Mu, que emergia das sombras com sua postura calma e um sorriso tranquilo.
Ryouma observou o homem por um momento, sem dizer nada. Lan Mu não parecia em nada alarmado com o que acabara de acontecer. Como sempre, ele estava em completo controle da situação, e sua presença transmitia uma sensação de calma disfarçada de frieza.
— Você está preocupado comigo? — Ryouma perguntou com um leve sorriso irônico.
Lan Mu deu um leve sorriso de volta, mas sua expressão logo se fez mais séria.
— Preocupado? Não. Mas… você deve saber que o que fez não é algo simples. Não é algo que se pode ignorar sem consequências. O Desespero Primordial é uma força muito antiga, e a própria essência dele… não é algo que pode ser controlado facilmente.
Ryouma sentiu um arrepio. O tom de Lan Mu, normalmente descontraído, agora carregava uma seriedade que ele não podia ignorar. Mas a curiosidade falou mais alto, e ele não recuou.
— E o que você sugere? Eu já tomei a decisão. Não posso voltar atrás agora. Não depois de tudo o que passei para chegar até aqui.
Lan Mu observou por um momento, como se estivesse pesando suas palavras. Então, ele deu um passo à frente, como se fosse desvelar algo profundo.
— O que você sente dentro de si agora, Ryouma? Uma sensação de poder, de controle, de algo que nunca imaginou que teria? Você deve saber que esse é o tipo de poder que destrói até os mais fortes. O que há dentro de você, embora poderoso, carrega uma maldição. E ao aceitá-lo, você também aceitou a maldição que ele traz.
Ryouma ficou em silêncio. Ele sabia exatamente o que Lan Mu queria dizer. O Desespero Primordial, esse espírito de força primordial, estava alterando-o. Ele sentia o peso crescente daquilo dentro de si. Como uma âncora invisível, ele se tornava mais forte, mas ao mesmo tempo mais… distante da pessoa que uma vez foi.
— E qual é o preço disso? — perguntou Ryouma, agora com mais seriedade. — O que devo fazer para que não me destrua?
Lan Mu o olhou com uma expressão intensa, como se estivesse revelando uma verdade antiga, guardada.
— O preço é sua própria essência. O Desespero Primordial não é apenas uma força, é uma essência de corrupção. Ele vai corroer sua humanidade aos poucos. Não vai destruir você fisicamente, mas vai fazer com que se distancie de tudo o que é importante para você. Seus aliados. Suas amizades. Seus próprios objetivos, até. No final, você será apenas a ferramenta de um poder que não tem intenção de ser usado por um simples ser humano.
Ryouma ficou em silêncio, absorvendo as palavras de Lan Mu. Ele sentiu a gravidade da situação. Era como se cada escolha que tomasse fosse uma corda apertando seu pescoço, e ele não podia mais se libertar. Já não havia um caminho de volta.
— E o que você sugere que eu faça? — perguntou Ryouma, sua voz mais calma agora, refletindo a verdade em sua mente.
Lan Mu olhou para o horizonte distante, o brilho de seus olhos quase etéreo. Ele parecia ponderar a pergunta por um momento, antes de responder.
— O caminho que você escolheu é perigoso, Ryouma. Mas eu acredito que você tem o potencial para controlar esse poder. Não é fácil. Vai exigir mais de você do que qualquer outra coisa que já tenha feito até agora. Porém, se você realmente deseja avançar, então deverá aprender a equilibrar os dois espíritos. O Desespero Primordial não pode dominar sua alma, nem o Dragão Abissal deve ser negligenciado.
Ryouma não disse nada, apenas olhou para Lan Mu com um semblante pensativo. As palavras de Lan Mu ressoavam em sua mente, mas, no fundo, ele sabia que não poderia seguir o caminho da inação. O poder que buscava era o que o separaria dos outros, o que lhe daria a chance de ser mais do que apenas um competidor. Ele queria ser um líder, alguém capaz de dominar o campo de batalha.
Mas a pergunta ainda pairava em sua mente, obscurecida pelo medo da verdade.
— E se eu falhar? O que acontecerá com minha alma?
Lan Mu apenas sorriu, o sorriso enigmático que tanto o caracterizava.
— Então você pagará o preço do fracasso. Mas é isso que nos torna fortes, não é? A capacidade de arriscar. De avançar, mesmo diante do abismo. Vamos ver até onde você pode ir, Ryouma.
Ryouma ficou em silêncio por mais um momento, olhando para o céu distante. Ele sabia que estava prestes a embarcar em uma jornada sem volta. E o mais importante: sabia que os maiores desafios ainda estavam por vir.
Porque o que ele estava começando a entender era que, no mundo em que agora se encontrava, ninguém se tornava verdadeiramente forte sem pagar um preço.
E ele estava disposto a pagar.