Cherreads

Chapter 46 - Espinhos e Confições.

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Capítulo – Espinhos e Confissões

O sol da manhã parecia mais real que nunca, como se quisesse compensar a noite infernal. Após deixar para trás os escombros do que pensavam ser uma hospedaria, o grupo retomou a estrada, em silêncio. O rastro da ilusão ainda os assombrava.

Foi Kátyra quem quebrou o gelo.

Ela cavalgava ao lado de Orren, rindo de algo que ele dissera sobre o cheiro de musgo nas botas de Aelys.

— Você devia passar essência de pinho, Orren — disse Kátyra, entre risos. — Pode ser que até o Tharion sorria com isso.

Orren respondeu com uma piscadela.

— Eu sorrio por bem menos, princesa. Mas aposto que você prefere caras mal-humorados e cheios de músculos.

Ela jogou os cabelos para trás, teatral.

— Depende da disposição... e do gosto por vinho.

Mais atrás, Aelys os observava em silêncio. O sorriso que fingia sumia devagar. Seus olhos, antes afiados como flechas, agora estavam enevoados.

Ao final da tarde, ela parou de falar. Orren tentou puxar conversa, mas ela respondeu com monosílabos. Kátyra notou e se aproximou.

— Aelys, o que houve?

— Nada — respondeu, seca.

Mas havia.

Kátyra a puxou pelo braço, afastando-a dos outros dois.

— Fala. Por favor.

Aelys hesitou. Seus olhos se encheram de lágrimas, mas ela disfarçou com raiva.

— Você está brincando com ele. E comigo.

— Com você?

— Eu gosto dele. Achei que você tivesse percebido. Achei que fôssemos amigas.

Kátyra ficou em silêncio, sentindo uma pontada que não conhecia bem. Não era dor. Era... culpa.

— Eu nunca tive amigos — disse, por fim. — De verdade. Sempre fui cercada de bajuladores ou inimigos. Eu não percebi... e agi como uma criança. Me desculpa, Aelys.

Aelys a olhou por um instante longo, depois assentiu com a cabeça. Tocou o ombro da princesa, gentil.

— Só... não precisa competir com ele. Você já é forte do seu jeito.

As duas sorriram, tímidas. E o laço começou ali, entre espinhos e confissões.

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Mais tarde naquela noite, quando pararam para descansar sob um arco de pedras antigas, Kátyra se afastou com Tharion, tentando puxar conversa.

— Aelys me perdoou — disse ela, testando o terreno.

— Que bom — respondeu ele, seco.

Ela se aproximou um pouco mais.

— Você ainda está com raiva de mim?

Tharion cruzou os braços.

— Não estou com raiva. Só estou... tentando seguir ordens. E proteger você.

— Ordens?

— De Dimitry — disse, firme. — Que eu a trouxesse de volta intacta. Que não dividisse o leito com você. E que não permitisse... infantilidades.

Kátyra se retraiu.

— Você está me chamando de criança?

— Quando você age como uma, sim — rebateu ele, firme. — Provocar ciúmes? Seduzir um companheiro de viagem? Me fazer de bobo?

Ela bufou, mas ele a cortou:

— O que você quer, Kátyra? Que eu quebre as ordens do seu pai? Que me condene por sua atenção? Que me case com você como um peão de tabuleiro?

Ela mordeu o lábio inferior, confusa.

— Eu... não sei.

Ele se aproximou devagar.

— Pois decida. Porque no fim, princesa... ou você vai ser rainha. Ou vai ser minha. Mas não dá pra ser os dois ao mesmo tempo.

Kátyra abaixou os olhos. Não tinha resposta.

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Enquanto isso, na escuridão além das colinas, uma nova praga se manifestava: flores negras crescendo nos campos, envenenando os rebanhos com um toque, e provocando delírios em quem as cheirasse. E, no centro das trevas, os olhos de Erizy brilhavam com prazer cruel.

— Que os sonhos deles... apodreçam.

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