A névoa da madrugada ainda cobria a planície ao redor da Floresta da Estrela Dou, quando Shin Ryouma abriu os olhos, sentindo o Sistema pulsar silenciosamente dentro de si. O ar estava carregado com uma tensão sutil, como se o mundo ao seu redor estivesse prestes a mudar. A última interação com Tang San havia deixado uma marca — tanto em sua mente quanto no fluxo invisível de seu caminho.
Ele se levantou devagar, cada músculo relaxado, mas atento. O treinamento noturno havia sido intenso — seu espírito marcial secundário, a Lança dos Mil Julgamentos, começava a mostrar traços de um novo estado evolutivo. Mais firme, mais afiado, mais... receptivo. Como se a própria arma estivesse respondendo não só ao seu esforço físico, mas ao conflito interno que começava a borbulhar. O Sistema o havia alertado:
[Conflito emocional detectado. Vínculo espiritual com a Lança: intensificado.][Interferência do Destino: Nível 3.][Rota de colisão com Tang San: inevitável.]
Essas mensagens tinham vindo no meio de um de seus combates de simulação. Ele sabia o que isso significava. Cada vez que crescia, que forçava seus limites, o fio invisível entre ele e Tang San se esticava ainda mais. Não era apenas rivalidade. Era algo predestinado. Algo que o Sistema, ou talvez o próprio mundo de Douluo, havia desenhado desde o início.
— Tang San… — murmurou, fitando o céu que clareava lentamente. — Está cada vez mais perto.
Enquanto isso, Tang San acordava do lado oposto da floresta, dentro do acampamento dos discípulos da Seita Tang. Havia sonhado com seu pai. Não era incomum. Mas naquele sonho, ele via o Martelo do Céu Claro não em suas mãos… mas nas de outro jovem. Um garoto de olhos escuros, frios como obsidiana, e um olhar carregado de dor e raiva. Um estranho, mas ao mesmo tempo familiar.
Tang San sentou-se ereto, o coração batendo mais rápido. Tocou o anel de ferro em seu dedo — o símbolo da herança do Clã Tang, o segredo que mantinha do mundo inteiro.
— Por que… esse sonho? — sussurrou. — Quem é você?
Na mesma noite, Ryouma também tivera sonhos — mas os seus não eram visões do futuro, e sim do passado. Do mundo anterior, de onde havia vindo. Seus treinadores, os olhos frios de seu pai adotivo, as cicatrizes em suas costas, os códigos de conduta, a ausência de amor… e a constante exigência de perfeição.
Naquele lugar, falhar significava morrer. E mesmo tendo escapado por um fio da morte, ele havia renascido em Douluo… para agora encarar um novo tipo de sobrevivência. Um mundo com regras espirituais, onde a força era respeitada, mas o destino era ainda mais cruel.
E ao contrário dos heróis dessa história, Ryouma não queria "salvar o mundo".
Ele queria vencê-lo.
O Sistema, silencioso há horas, finalmente falou:
[Condensação Espiritual concluída.][Nova habilidade despertada: Reflexo da Verdade – permite ver através de ilusões, enganos e disfarces espirituais, com base no esforço contínuo de percepção e combate.]
Ryouma sorriu de canto. Ele havia treinado duramente para isso. Nos últimos cinco dias, passara horas enfrentando feras ilusórias criadas pela habilidade da Fênix Mental, um dos espíritos auxiliares que havia absorvido após uma caçada arriscada. E agora… havia colhido os frutos.
Sua mente clareava, não apenas em combate, mas também nas emoções. Ele começava a compreender que sua jornada não era sobre ser o mais forte… mas sim o mais livre. Livre das amarras da história original. Livre das amarras do destino.
Mas isso exigiria algo drástico.
— Eu preciso encontrá-lo de novo — murmurou. — Tang San.
Na Seita Tang, os mestres discutiam os resultados do último treinamento em grupo. O nome de Ryouma começava a circular, ainda que em sussurros.
— Aquele garoto… de olhos afiados… quem é? — questionou um dos instrutores. — Vi como lutou. Nenhuma técnica conhecida. Nenhuma emoção. Como se fosse… um lobo solitário.
Tang San não comentou nada, mas por dentro, seus pensamentos giravam.
Ele também sentira algo estranho quando cruzaram olhares na última simulação.
Era como olhar para um espelho distorcido.
Um reflexo sombrio.
Mais tarde, naquele dia, Ryouma cruzou a fronteira da Floresta da Estrela Dou novamente. Não estava lá para caçar — estava lá para testar um risco. Uma possibilidade perigosa.
Ele invocou seus dois espíritos marciais ao mesmo tempo.
A Lança dos Mil Julgamentos brilhou com uma aura carmesim, enquanto o segundo espírito — até agora oculto — começou a se manifestar: uma sombra serpentina, envolta em correntes negras, surgiu do chão, retorcendo-se até formar a Serpente do Julgamento Silencioso.
[Alerta: Dupla manifestação simultânea. Risco de colapso espiritual: 37%.][Você está ultrapassando os limites definidos pelas doutrinas espirituais atuais.][Sistema registrando nova categoria: Espírito Marcial de Natureza Antitética.]
Ryouma sentiu o peso esmagador sobre seu corpo. As correntes da serpente pareciam querer prender sua alma. Mas ele resistiu. Mordeu o lábio até sangrar. O Sistema brilhava em sua mente.
[Resistência ao colapso aumentada por esforço. Ajustando limites.]
A dor virou controle.
O controle virou poder.
A explosão espiritual fez com que várias feras da floresta fugissem, e três mestres da Seita Tang que estavam próximos chegaram às pressas.
Mas quando chegaram, encontraram apenas as marcas queimadas no chão e o cheiro de ozônio e sangue no ar.
— Ele não é comum — disse um deles. — E seja lá o que ele esteja preparando… não se parece com nada que já vimos antes.
Naquela mesma noite, enquanto a lua brilhava cheia e silenciosa no céu de Douluo, Shin Ryouma olhou para o reflexo da água e viu algo diferente. O menino que um dia fora condicionado a não sentir… agora sentia. E isso tornava tudo mais perigoso.
Porque o verdadeiro poder… não estava apenas em habilidades ou técnicas.
Estava naquilo que o Sistema chamava de:
[Fator Humano: Vontade Inquebrável.]
E essa era a única coisa que Tang San ainda não tinha.
Mas um dia… teria que aprender. Ou cair diante dela.
E quando esse dia chegasse, Ryouma estaria lá.
Com sua lança.
Com seu ódio.
Com sua liberdade conquistada pelo esforço.
E o Sistema observando tudo, silencioso, como um deus oculto entre as linhas do mundo.