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Capítulo — O Despertar do Sangue e da Luz
O céu sobre Nivélion rompeu-se em gritos e asas. Trombetas de vento anunciaram a chegada da tempestade alada.
Cora surgia entre as nuvens, montada em seu grifo de penas douradas e garras de obsidiana. Atrás dela, um exército aéreo se estendia — centenas de grifos, batedores do Clã do Ar, magos da Casa do Grifo, e até sobreviventes esquecidos da última revolta do Norte. A bandeira do grifo, antes caída, agora tremulava no alto com fúria e renascimento.
No salão, o espelho que revelara o homúnculo de Erizy explodiu em mil fragmentos. A criatura diante de todos dissolveu-se, e o verdadeiro príncipe da Serpente deu um passo adiante, envolto por uma aura escura como vácuo.
— Vocês querem a verdade? — disse Erizy, a voz dobrando-se como metal retorcido. — Então vejam o que sou.
Seus olhos tornaram-se poços sem fundo. Chamas negras subiram de sua pele. Suas costas se romperam em asas feitas de sombras vivas. Não era mais um Guardião. Era algo anterior. Um Ataxa. Um filho renegado das estrelas caídas.
Os Darxas se levantaram em uníssono. Pela primeira vez, falaram como um só:
— O sangue dele não é de Nefilim... é mais antigo que o mundo. É a herança dos Primeiros Caídos.
Adam, com os olhos iluminados pela runa da verdade, desceu as escadas lentamente. Seu bastão, antes símbolo de realeza, agora era uma arma viva, pulsando com energia dos antigos.
— Erizy, filho das trevas, por tua mentira, tua arrogância e tua violência... serás julgado.
E então o chão tremeu.
De um lado, os golens de Adam avançavam. Do outro, as sombras de Erizy tomavam forma: bestas aladas, armaduras vivas, espectros dos tempos antes do tempo.
Do lado de fora, Cora irrompia pelos vitrais com seus grifos, em um vendaval de luz e aço. O salão virou campo de guerra.
E no meio do caos, Adam e Erizy se encararam — dois titãs de eras distintas.
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As colunas do Salão de Mármore estremeceram. Os vitrais estilhaçados brilhavam no ar como fragmentos de tempo congelado. Soldados se dispersavam, grifos mergulhavam em rasantes furiosos, e o som das espadas ecoava como um coral de aço.
Mas o centro de tudo era o duelo.
Adam avançou com passos firmes, seu bastão se alongando, transformando-se em uma lâmina de cristal viva, forjada com o fogo dos antigos. Seus músculos, ainda vigorosos apesar da idade, transbordavam o poder da linhagem dos Ursos — força, coragem e sabedoria ancestrais.
Erizy, tomado por sua verdadeira forma, alçava voo com asas feitas de puro vazio. Raios negros saíam de suas mãos, e o chão rachava onde seus pés tocavam. Seus olhos não carregavam ódio — carregavam um destino sombrio, convicção de que o mundo deveria ser curvado à vontade dos sombrios.
— Por que lutar, velho rei? — zombou ele, pairando no ar. — Já estás esquecido. O tempo dos puros acabou.
Adam ergueu o bastão-espada.
— Enquanto a memória viver, o esquecimento nunca vence.
O impacto do primeiro embate foi como uma estrela se chocando contra a terra. A onda mágica lançou nobres e soldados longe, partiu pilares ao meio, e abriu um círculo de destruição entre os dois titãs.
Adam conjurou um golem urso de armadura rúnica, que se lançou contra as bestas sombrias de Erizy, dilacerando sombras com garras de luz. Homúnculos tomaram formas dracônicas, rugindo ao lado dos grifos liderados por Cora.
Erizy gritou um comando na língua dos Primeiros Caídos — e o salão tremeu. Da terra, ergueu-se um colosso feito de ossos e sombras, um Ser Abissal, que consumia tudo à sua volta. Mas Adam, com o peito ferido, gritou em resposta, e uma onda de energia branca desceu do teto, banhando o salão como luz solar em dia de tempestade.
— Emet! — ele bradou, palavra da criação. E a criatura se desfez em cinzas.
O rei cambaleou. Sangue escorria por seu manto. Seus olhos ainda ardiam.
— Acabe com ele... — disse Dimitry, tentando correr até o pai.
Adam ergueu a espada de cristal uma última vez.
— Pelo nome que esqueceste. Pela criança que manchaste. Pelo mundo que ousaste ferir...
Erizy desceu como um raio negro, tentando cravar a lança das sombras no peito do rei.
Mas Adam desviou no último instante.
E então, com um golpe que parecia conter o peso de milênios, ele transpassou o peito de Erizy, que gritou, não de dor... mas de incredulidade.
— Eu sou... eterno...
— Não mais. — sussurrou Adam, cravando a runa final na testa do inimigo.
Erizy se desfez. Seu corpo virou um redemoinho de sombras que gritou até evaporar.
Silêncio.
E então, Adam caiu de joelhos. Dimitry o segurou.
— Pai! Não...
— A luz... voltará. — disse Adam, sorrindo com a boca ensanguentada. — Protejam... a tempestade e a criança. Eles são o novo mundo...
Seu corpo brilhou. Uma última onda de magia atravessou o salão como uma bênção. E então, ele se foi.
O rei de Nivélion havia tombado. Mas não sem antes vencer a escuridão.